quinta-feira, 18 de abril de 2013

Análise do poema “Rodopio”

Rodopio
Mário de Sá-Carneiro

Volteiam dentro de mim,
Em rodopio, em novelos,
Milagres, uivos, castelos,
Forças de luz, pesadelos,
Altas torres de marfim.

Ascendem hélices, rastros...
Mais longe coam-me sóis;
Há promontórios, faróis,
Upam-se estátuas de heróis,
Ondeiam lanças e mastros.

Zebram-se armadas de cor,
Singram cortejos de luz,
Ruem-se braços de cruz,
E um espelho reproduz,
Em treva, todo o esplendor...

Cristais retinem de medo,
Precipitam-se estilhaços,
Chovem garras, manchas, laços...
Planos, quebras e espaços
Vertiginam em segredo.

Luas de oiro se embebedam,
Rainhas desfolham lírios:
Contorcionam-se círios,
Enclavinham-se delírios.
Listas de som enveredam...

Virgulam-se aspas em vozes,
Letras de fogo e punhais;
Há missas e bacanais,
Execuções capitais,
Regressos, apoteoses.

Silvam madeixas ondeantes,
Pungem lábios esmagados,
Há corpos emaranhados,
Seios mordidos, golfados,
Sexos mortos de ansiantes...

(Há incenso de esponsais,
Há mãos brancas e sagradas,
Há velhas cartas rasgadas,
Há pobres coisas guardadas -
Um lenço, fitas, dedais...)
 
Há elmos, troféus, mortalhas.
Emanações fugidias,
Referências, nostalgias,
Ruínas de melodias,
Vertigens, erros e falhas.

Há vislumbres de não-ser,
Rangem, de vago, neblinas;
Fulcram-se poços e minas,
Meandros, pauis, ravinas
Que não ouso percorrer...

Há vácuos, há bolhas de ar,
Perfumes de longes ilhas,
Amarras, lemes e quilhas -
Tantas, tantas maravilhas
Que se não podem sonhar!...

Mário de Sá-Carneiro, embora enquadrado literariamente na escola Modernista, sofreu, de fato, influências de Charles Baudelaire, importante poeta decadentista francês. Uma das características mais importantes de Baudelaire é o pessimismo, tema recorrente nos poemas dos simbolistas. É por meio de termos como “pesadelos”, “treva” e “medo” que Sá-Carneiro, em seu poema “Rodopio”, demonstra o pessimismo-decadentista, influência do referido poeta francês. No mesmo poema, no que diz respeito à métrica, pode-se dizer que os versos são heptassílabos ou redondilhos maiores, mostrando sua preocupação com a forma, diferentemente dos modernistas. Quanto às rimas, o primeiro verso de cada estrofe rima com o último da mesma estrofe. Os demais versos rimam entre si dentro das estrofes. O poeta faz, ainda, uso de uma sugestão de frieza, com “marfim” e “estátuas”. Há aliteração, por exemplo, no seguinte verso: “upam-se estátuas de heróis”, vide a repetição dos sons consonantais “s”. Note-se, também, o uso de reticências, dando, além de um tom sugestivo ao texto, ideia de sonoridade, observada, por exemplo, em “ascendem hélices, rastros...”, em que ocorre, novamente, repetição dos sons consonantais “s”. Observe que em todo o poema há imagens do cotidiano e ideia de movimento, o que lhe dá um toque de modernidade.

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